30.5.05

[outros melros XXV]

MÁRIO DE CARVALHO

Gosto de melros, os espertotes, ladinos, com aquele jeito preto de recalcitrar de lado. Há poucos pelas relvas de Lisboa, não sei se da concorrência de pardais fura-vidas e de pombalhões abafa-espaços, se de uma vontade de saltitar ao de leve por outras bandas.
Ainda assim, aparecem uns tantos pela feira do livro, a lavrar no parque. Negrejam aos picos no verde, dão-se a uns desenfados de voejo breve, armados em superiores. Bonito bicho, de muita inspiração literária. Ele é o Jean-Baptiste Clément, ele é o Junqueiro...
Não há melros num espaço fechado, num armazém tristonho e esquadrinhado de encontrões sem sol. Todos os anos aquele para-baixo e para-cima, os encontros de fulano e cicrano, as capas que amadurecem de ano para ano, a luz explosiva de Lisboa, os revérberos, o Marquês que medita, as frondes da avenida, o Tejo glauco a fechar as vistas.
Tenho estado em salões, por essa Europa. Salões, salas grandes, com o seu quê de fábrica e hangar. Em parte nenhuma há esta cor, esta brisa este céu, esta extensão clara, esta alegria. Mude-se o que houver a mudar. O espaço, deixar estar.

(in Os Livros no Parque, editado por 9 editoras e distribuído gratuitamente na Feira do ano passado)

Sem comentários: