19.1.09

C. S. LEWIS

Porque dou eu guarida no meu espírito a tanto lixo e disparate? Estarei na esperança de que, se o que sinto se disfarçar de pensamento, sentirei menos? Não serão todas estas notas as contorções sem sentido de um homem que não quer aceitar o facto de que nada há a fazer quanto ao sofrimento, a não ser sofrê-lo? Que ainda julga haver alguma manigância (se ao menos ele a conseguisse descobrir) que faça a dor deixar de ser dor. Mas, na realidade, pouco importa que nos agarremos aos braços da cadeira do dentista ou que mantenhamos as mãos quietas no colo. A broca continua a brocar.
E a dor continua a assemelhar-se ao medo. Talvez, mais precisamente, à ansiedade. Ou à expectativa. Estar simplesmente na expectativa de que alguma coisa aconteça. E isso dá à vida um sentido permanentemente provisório. Não parece que valha a pena começar a fazer seja o que for. Não consigo sossegar. Bocejo, agito-me, fumo demais. Até isto acontecer, tinha sempre demasiado pouco tempo. Agora não há mais nada senão tempo. Tempo quase puro, um vazio consecutivo.

(excerto de Dor, tradução de Carlos Grifo Babo, Grifo – editores e livreiros, 1999)

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