8.4.10

[a propósito de novíssimos...]


PAI SOARES DE TAVEIRÓS

No mundo non me sei parelha,
mentre me for como me vai,
ca já moiro por vós e ai,
mia senhor branca e vermelha!...
Queredes que vos retraia?
Quando vos eu vi en saia,
mao dia me levantei
que vos enton non vi fea!

E, mia senhor [branqu' e vermelha],
mi foi mal dês aquel di', ai!
E vós, filha de Don Paai
Moniz, e ben vos semelha
d' aver eu por vós guarvaia?
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vós ouve nen ei
valia dua correa.

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É o texto poético mais antigo da língua portuguesa. Não se lhe pode fixar precisamente a data; mas tem-se-lhe atribuído com aceitáveis fundamentos as datas de 1189, 1198 e 1206. A primeira data, 1189, é a mais geralmente adoptada. Seu autor, Pai Soares de Taveirós, vivia no tempo de Sancho I e dirige na cantiga os seus louvores à filha de D. Pai Moniz, a formosa Maria Pais Ribeiro, amiga do rei português. É natural que o cantar tivesse sido composto antes das relações do rei com a «Ribeirinha», cuja formosura deu tanto que falar, no tempo. O poeta, em penhor do seu afecto, pede-lhe uma prenda — uma guarvaia. Estas prendas dadas pelos namorados chamavam-se dõas.

parelha - Igual.
que vos retraia - Que vos pinte, que descreva as vossas graças, denunciando-vos. O trovador era obrigado a guardar segredo. Contudo, na estrofe seguinte levanta uma ponta do véu, mencionando-lhe o pai.
mao [mau] - A palavra mao tinha ainda duas sílabas.
semelha - Parece.
guarvaia - Sobreveste de luxo, ao que parece de escarlata. e veste de vestuário só própria de senhores de muito alta condição.

(in Crestomatia Arcaica, selecção, prefácio e notas de Rodrigues Lapa, sem indicação de editor, 1940)

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