6.5.12

RITA TABORDA DUARTE


TORNAR-SE O SER CRIADO EM CRIADOR

A Francesco Petrarca
Justo é saber que cada um já    retomou
A falsa-humilde condição de um servidor
E por fim finja não ser ele o criador
De quem afinal fingimos      que nos criou

Porque alguém que escreve é também alguém que é lido
Por um outro alguém que se lê           como num espelho,
À certeza inquieta do gesto     devolvido.

É ténue a linha entre a verdade e a aparência :
E se o estilo é doce é menos novo do que é velho,
Que só pel' efémero se sustenta a permanência.

Nem se sabe por que medida se mede o homem
Sequer de quem nos recebemos por herança
Mais: talvez só    sejamos sombra    à semelhança
Das demais fábulas absurdas que nos consomem


(de Na Estranha Casa de Um Outro [Esboço de uma biografia poética], edições Asa, 2005 - colecção pequeno formato)

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