PAUL ÉLUARD
DOMINGO À TARDEEnlaçavam-se os domínios arqueados de uma aurora cinzenta, num país cinzento, sem paixões, tímido,
Enlaçavam-se os céus implacáveis, os mares interditos, as terras estéreis,
Enlaçavam-se os galopes incansáveis de cavalos magros, as ruas onde já não passavam os carros, os cães e os gatos moribundos,
Aureolavam-se as aparências, os dias infindáveis, dias sem luz, as noites absurdas,
Aureolava-se a esperança de uma neve definitiva, marcando na fronte o ódio,
Adensavam-se os astros, adelgaçavam-se os lábios, alargavam-se as frontes como mesas inúteis,
Curvavam-se os cumes acessíveis, adoçavam-se os mais insípidos tormentos, comprazia-se a natureza numa única função,
Respondiam-se os mudos, escutavam-se os surdos, olhavam-se os cegos
Nestes domínios confundidos onde até as lágrimas só se miravam em espelhos lamacentos, neste país eterno que misturava os países futuros, neste país onde o sol ia sacudir as suas cinzas.
(Tradução de António ramos Rosa, in
Antologia, edições Tempo, [s/d] - original de
Poésie et Vérité, 1942)