MANUEL ALEGREEu fui, há já muito tempo, o que actualmente se chama “um atleta de alta competição”.
Cheguei a internacional, fui campeão nacional de natação, conheci, em todo o esplendor e intensidade da juventude, a glória efémera de subir ao pódio.
Talvez por isso eu nunca tenha confundido literatura com qualquer espécie de campeonato. Não é uma corrida de velocidade nem de fundo. Ninguém sabe em que lugar chega ou em que lugar fica. Só o tempo o dirá. E isso não é sequer o mais importante. O que conta é aquilo a que eu chamaria estado de escrita. E que é uma espécie de estado de graça, tão intenso e efémero como o de subir ao pódio. O que conta realmente, é esse estado de vivencia mágica, de mediação ou vidência, como queria Rimbaud. Essa revelação do mundo através da palavra poética. Eu acredito que cada palavra contém o universo. E que um verso errado pode eventualmente alterar o equilíbrio cósmico. Acredito na poesia, que está antes e depois da literatura. E que é sobretudo a busca incessante dos ritmos primordiais. Ou como diz Octavio Paz: “litania, oração, exorcismo, liturgia, celebração”.
(inicio do discurso de aceitação do
Grande Premio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores, 1998 – in
O Escritor – revista da Associação Portuguesa de Escritores Nº 13/14, Dezembro de 1999)