Tão ao jeito dos desaforismos do O'Neill
(mas com epígrafe de Ruy Belo)
30.6.05
NUNO GUIMARÃES
Doença de palavras com morfina
sobre o peito que seca e envelhece
(as palavras as pedras como doem)
um peso em cada peito
deserto cada vez mais na raiz.
Não é bem a secura das palavras
mas a secura de aves. Perigoso
estio que, pesando sobre as asas,
lhes fere o voo livre.
Aves de seca. Anos que se queimam
noutro passe, outra morte, outra incerteza
outro repouso algébrico dos membros.
Nem a margem dos rios se acomoda
ao rumor geométrico do fogo
às formas aos sinais - o sedimento
onde as noites e o sono se acumulam
as areias, a fome, o movimento,
o corpo saturado nas arestas.
(de Corpo Agrário, 1970)
Doença de palavras com morfina
sobre o peito que seca e envelhece
(as palavras as pedras como doem)
um peso em cada peito
deserto cada vez mais na raiz.
Não é bem a secura das palavras
mas a secura de aves. Perigoso
estio que, pesando sobre as asas,
lhes fere o voo livre.
Aves de seca. Anos que se queimam
noutro passe, outra morte, outra incerteza
outro repouso algébrico dos membros.
Nem a margem dos rios se acomoda
ao rumor geométrico do fogo
às formas aos sinais - o sedimento
onde as noites e o sono se acumulam
as areias, a fome, o movimento,
o corpo saturado nas arestas.
(de Corpo Agrário, 1970)
29.6.05
ARMANDO DA SILVA CARVALHO
21.
O verso fabricado não caiu repentino
da pálpebra perfeita.
Também não foi um pulo. Nem o motor
pateta de quem quer dar ao dedo.
Na fissura do liso alfabetado
ardeu a impaciência - agora branda purga
contra os canais histéricos
que refluem no tempo.
Dizem do pobre, a pobreza de espírito,
a limitada obcessão do que é pequeno.
O rótulo não delimita a obra das matrizes
os cristais literários
que o dedo aflora e logo sai repleto
com essa carga eléctrica que explode no silêncio.
As câmaras vivas que a memória habita
reproduzem-se. A fala incha.
As babugens sonoras são este eco do mar,
do mar humano.
Coabitas agora com os parvos da história.
Os que arrastam nos gestos a identificação,
a idade senil dos personagens,
o rio contuso das turvas lavagens cerebrais
sobre um palco doente.
Ouve a bailarina, o arquiduque, o chefe
das metáforas. Toma tento em como se desfaz
a hipérbole cantante no rosto amarelado
e que simula a fala perversa do desejo.
Não isoles o verbo dos seus dados sonoros:
o jogo de mãos, as paulatinas figuras
dos sentidos, os espaços aéreos,
a branca curva que restringe sobre os cemitérios
o árido prazer que te relegam os mortos.
De cada coisa a cada coisa a luz.
A fístula que a febre insonorizou
na garganta doente
seja a poção metálica
seja o fulgor do cérebro na boca
entreaberta.
(de Armas Brancas, 1977)
21.
O verso fabricado não caiu repentino
da pálpebra perfeita.
Também não foi um pulo. Nem o motor
pateta de quem quer dar ao dedo.
Na fissura do liso alfabetado
ardeu a impaciência - agora branda purga
contra os canais histéricos
que refluem no tempo.
Dizem do pobre, a pobreza de espírito,
a limitada obcessão do que é pequeno.
O rótulo não delimita a obra das matrizes
os cristais literários
que o dedo aflora e logo sai repleto
com essa carga eléctrica que explode no silêncio.
As câmaras vivas que a memória habita
reproduzem-se. A fala incha.
As babugens sonoras são este eco do mar,
do mar humano.
Coabitas agora com os parvos da história.
Os que arrastam nos gestos a identificação,
a idade senil dos personagens,
o rio contuso das turvas lavagens cerebrais
sobre um palco doente.
Ouve a bailarina, o arquiduque, o chefe
das metáforas. Toma tento em como se desfaz
a hipérbole cantante no rosto amarelado
e que simula a fala perversa do desejo.
Não isoles o verbo dos seus dados sonoros:
o jogo de mãos, as paulatinas figuras
dos sentidos, os espaços aéreos,
a branca curva que restringe sobre os cemitérios
o árido prazer que te relegam os mortos.
De cada coisa a cada coisa a luz.
A fístula que a febre insonorizou
na garganta doente
seja a poção metálica
seja o fulgor do cérebro na boca
entreaberta.
(de Armas Brancas, 1977)
«Há um poeta
Há um poeta a que poucos ligam. Chama-se Armando da Silva Carvalho.»
Assim começa um post de Manuel Resende, que mereceu a justa reacção, na caixa de comentários, de dois dos poucos que ligam, Osvaldo Manuel Silvestre e Eduardo Pitta.
Eu também reajo, pois que na minha modéstia de mero leitor de poesia (e de prosa, em que ASC é tão, ou mais, acutilante como na poesia; e, além disso, tradutor) também lhe ligo.
28.6.05
Constatação geracional
Um, dois (com insistência), três...
(as infâncias de quem nasceu em 1972 passou pelos verões azuis)
Um, dois (com insistência), três...
(as infâncias de quem nasceu em 1972 passou pelos verões azuis)
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