AMADEU BAPTISTA
ISAÍAS
Quem quer que sejas, persevera.
Ainda que o templo seja destruído
e sejam pavorosas as notícias,
permanece na luta, da fé ou do instinto.
Que os teus dedos marquem
a página em que estiveres para que perdures,
para que te defendas dos ferros da ameaça,
do desterro,
do açoite feroz,
da escravatura.
Ah, persevera.
Em ti, no que vês e não vês
à tua volta, no labirinto interior
em que te perdes, nas areias escaldantes
do deserto, no arco assírio que te malbarata,
em todo o mal que vês ratificado
pelos que te governam,
nos actos levianos da ganância,
nas ímpias acções que vês nos pios,
hás-de encontrar a luz,
a luz que te desola mas te ergue.
Ah, persevera.
Porque não mais haverá
violência sobre a terra e haverá vinho.
Porque se há-de alargar o lugar
da tua tenda e há-de segurar-se a tua estaca,
e a paz dos teus oficiais há-de fazer-se,
e dos teus magistrados a justiça,
e o desamparo esquecerás para sempre.
(de Sistina, Edita-Me editora, 2014)