BEN LERNER
O problema fatal da poesia: poemas. Isto ajuda a explicar o porquê de os próprios poetas celebrarem poetas que renunciaram à escrita. Na faculdade, no fim do milénio passado, os jovens poetas mais fixes que conhecia andavam a ler Rimbaud e [George] Oppen – dois muito grandes e muito diferentes escritores que em comum tinham o facto de terem abandonado a sua arte (ainda que em Oppen fosse apenas temporário). Rimbaud para de escrever aos vinte e poucos e começa a dedicar-se ao tráfico de armas; Oppen fica famosamente calado durante 25 anos enquanto vive no México para escapar a inquéritos do FBI sobre as suas atividades sindicais. Rimbaud é o ‘enfant terrible’ que arde através do dizível; Oppen é o poeta da esquerda cujo silêncio é sinal de compromisso. «Porque não estou calado», escreveu Oppen num poema, «os poemas são maus». Os silêncios de ambos tanto quanto as suas obras – ou os seus silêncios como obras conceptuais – eram o que os tornava os heróis dos meus conhecidos que entretinham aspirações a poetas. Era como se a escrita fosse um nível pelo qual fosse preciso passar, como se os poemas fossem importantes porque poderiam ser sacrificados no altar da poesia, de maneira a carregar o nosso silêncio com virtualidade poética. (E a pretensão à renúncia da poesia está dentro de todos os poemas – deixá-la é uma convenção: lamentamos a insuficiência do nosso canto, destruímos a nossa flauta pastoril. A ficção de que um poema possa ser o último de um determinado poeta outorga a promessa do virtual nas palavras reais. É uma técnica que remonta, pelo menos, a Virgílio). Deste modo, poeta e não-poeta atingem ambos, em última análise, a não-poeticidade, com a diferença de que o primeiro passa pelos poemas, enquanto o último se afasta deles.
(excerto de Ódio à Poesia, tradução de Daniel Jonas, Elsinore, 2017)