18.2.12


ADOLFO CASAIS MONTEIRO


TRÊS POEMAS DE LONDRES

I

Talvez, estrangeiro em qualquer parte,
fosse a minha pátria ser livre
no diverso perder-me em todo o mundo...

Talvez esta imagem me persiga
até ao fim, de ser nada em toda a parte,
para ser cada novo instante um estrangeiro
que não entende sequer a língua de si mesmo.
Talvez na vida valha só perdermos
a ganhar outro ser em cada coisa
– e saber algum dia ser ninguém, pousando
sobre a quimera das horas o sorriso
de quem tanto perdeu que nada é mais...

II

Quantas vezes a vida principia?
Tudo é começar, quando se ama!
Amor de quê? Da névoa e do silêncio
subindo entre o passado e o presente?
Ou do claro esvoaçar de um riso
que entre as pálpebras da noite se adivinha?

III

                                  Ao Sérgio Viotti

Dorme na paz provisória
de ser como não haver morte.

Não queimes a inocência
de que o dia te vestiu.

Sonha, acordado, sem luto
por tudo ter sempre um fim.

Deixa, queimado no porto,
o navio do regresso

– contigo vai só o vento
que não tem âncora, nem lei.


(de Noite Aberta aos Quatro Ventos, 1943/1959)

'Caderno de Milfontes' já disponível


Tenho o gosto de informar que o meu novo livro de poemas, Caderno de Milfontes, já pode adquirido.
Sendo uma edição restrita (apenas 150 exemplares), a editora Volta d'Mar (sediada na Nazaré e da responsabilidade do Luís Paulo Meireles e do Mário Galego) optou por fazer as vendas apenas através de contacto directo (ver abaixo).
Através do link podem ficar a conhecer também os outros livros já editados ou a editar por eles.



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apartado 93
2450 nazaré

17.2.12

GIÁNNIS RITSOS


A POSTERIORI

Ao ponto a que as coisas chegaram, ninguém – dizemos – tem culpa. Um partiu;
o outro foi morto; os outros – como contá-los agora?
As estações mudam-se regularmente. Os loendros florescem.
A sombra move-se à volta da árvore. A bilha imóvel
ficou à torreira do sol, secou; a água foi-se. Contudo,
podíamos – diz ele – deslocar a bilha, para aqui, para ali,
conforme a hora, e a sombra, à volta da árvore,
girando até encontrarmos o ritmo, dançando, esquecendo
a bilha, a água, a sede – já sem sede, dançando.

20.V.68


(in Antologia, Selecção, Tradução e Prefácio de Custodio Magueijo, Fora do Texto, 1993)