ANTÓNIO MANUEL COUTO VIANA
INTERIORPOR trás dos muros da nossa casa
Estamos tão juntos que nos tocamos:
O vento é brisa e a brisa é asa.
Por trás dos muros da nossa casa
Todos os frutos ficam nos ramos.
Vivamos, pois, dentro de nós,
Deixando aos outros o gesto e a voz.
3-Novembro-49RECOMPENSAVENHA um momento de Poesia:
Que eu sinta essa alegria casta e saborosa
De quem lidou todo o dia
E pediu, como paga, uma pequena rosa!
Venha, de novo, o coração e a espada
(Que saudades de mim quando adormeço
E a vida se me dá completa, mas errada
Como um avesso)!
Venha o beijo sem lábios que redime
As chagas vis do meu peito
— O único perdão para o meu crime
De ser real e estreito!
— Mas só tu, que expulsei dos meus poemas
Por não te querer saber demais de cor,
Me vens cobrir de injúrias e de algemas:
O teu beijo e a tua flor!
2-Abril- 49CÂNTICOTEMOS o odor e a cor que tem
A flor pendente dos ramos,
Pois somos virgens para além
Dos beijos que trocamos.
Só a nós nos é dado o Santo Graal
E vamos puros quando o amor nos chama;
Iguais perante o Bem, perante o Mal,
Temos asas de luz em mares de lama.
Tanto basta pra sermos celebrados:
Os nossos corpos, quando unidos, dão
O branco ao sol, o azul ao céu, o verde aos prados
E o ritmo de vida ao coração.
26-Agosto-49NASCENTESOUBESSEM o quanto me custa sabê-los
Medrosos, inquietos, na noite indiferente:
As mãos tacteando os soltos cabelos,
Os olhos possessos de um brilho doente:
Sózinhos, vazios de crenças submissas,
Sem rastros de estrelas ou pombas no ar...
— Areias de Alcácer, fatais, movediças,
Lhes 'stão exigindo morrer devagar.
Soubessem o quanto me custa a recusa
Da flor dum sorriso, da cor dum afago;
Que angústia indomável se expande e soluça
Nos versos que escrevo, nos sonhos que trago.
Sofrei, penitentes sem luas redondas.
Com chagas na alma, sem pensos de linho!
— Meu Deus, se os escutas, por Deus! não respondas
A's preces piedosas de calma e de ninho.
Deixá-los, gritando o mal sem remédio
De pálidas febres, de rosas esguias;
Deixá-los, submersos no ignoto mistério
Do crime das horas, na ronda dos dias.
Quem nasce humilhado com loiros e glória;
Quem vê do seu berço os frutos maduros,
Não sabe a que sabe o sabor da vitória,
Pois não há vitória nos passos seguros.
Mas custa, eu sei quanto! sabê-los sem rumo,
Na noite indiferente, julgados perdidos.
Cativos: a vida é mais do que um fumo ?
……………………………………………………………………
— Roubei à Poesia meus cinco sentidos.
2-Janeiro-50Desenhos e poemas da primeira página de:
[clicar para ver melhor]
(reproduções a partir da edição fac-similada: Contexto editora, 1989)
outras evocações (pela ordem por que as vou vendo):
Resumo biográfico,
em Porosidade EtéreaAlguns poemas e
uma ilustração do Afonso Cruz,
em Pisca de GenteContinuação da publicação de
Café de Subúrbio,
em Café CentralNota de
Manuel Poppe (...«
A Literatura não é um campeonato e as opiniões de cada um são subjectivas e sujeitas a contestação.»...),
em Sobre o RiscoTestemunho de
Mário Cláudio,
no PúblicoUma fotografia,
em O Melhor AmigoNotícia e memória de Homenagem, no
blogue da Associação Portuguesa de Poetas, de que era Sócio Honorário
Um significativo poema,
em antologia do esquecimentoMemória da última visita do
Victor Oliveira Mateus,
em A Dispersa PalavraUm resumo crítico de
Eduardo Pitta (...«
A genealogia entronca em Garrett, Nobre, Pascoaes, Afonso Lopes Vieira, António Sardinha e Malheiro Dias.»...),
em Da LiteraturaNota e transcrição de um poema sobre
Camões, por
José Mário Silva,
em Bibliotecário de Babel