CEES NOOTEBOOM
ENGODOA poesia não pode tratar de mim,
nem eu da poesia.
Estou só, o poema está só,
o resto é dos vermes.
Estava à beira das ruas onde moram as palavras,
livros, cartas, notícias,
e esperava.
Sempre esperei.
As palavras, em formas claras ou escuras,
transformaram-se em alguém escuro ou mais claro.
Poemas passam por mim
e reconheciam-se como coisa.
Via-o o via-me.
Esta escravidão não tem fim.
Esquadrões de poemas procuram os seus poetas.
Vão errando sem comando pelo grande distrito das palavras
e esperam o engodo da sua forma
feita, perfeita, fechada,
concentrada e
intangível.
(in
Um Mundo Claro, Um dia escuro – Oito Poetas Holandeses, tradução de August Willemsen e Egito Gonçalves, Limiar, 1988 –
Os olhos e a memória / original de
Aas / Engodo, 1982)