[para uma antologia de bicicletas – 18]
JOSÉ MIGUEL SILVA
EM LUCCA, AS BICICLETAS
Mimados animais de estimação,
em Portugal os automóveis são felizes,
agradecem, quase incrédulos, a sorte
de lhes terem ofertado em passerelle
o mais honroso dos cenários e desfilam
como príncipes de crómio pelas ruas
desertadas de nocivos habitantes.
Aqui sentir-se-iam humilhados
pela ordem de ceder ao musculoso
bipedismo de pessoas a passagem
ou, pior, à irritante placidez
das bicicletas, traquitanas que lograram,
por estranho que pareça, conquistar
a simpatia dos estúpidos humanos
que povoam (é incrível!) a cidade.
Cruelmente desprezados, racionados
como párias, em Lucca os automóveis
não encontram um passeio onde encostar
a fatigada suspensão, uma sombrinha
de jardim, uma oficina, o refrigério
combustível de um amigo que socorra
a sua sede de viver rapidamente.
(de Erros Individuais, Relógio d'Água, 2010)
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Há 4 horas
1 comentário:
Pedalando vamos.
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