21.4.11

DANIEL FARIA (sob o pseudónimo Sérgio de Sempre)


A Casa de Deus

I

Longos degraus tem a primavera
E uma mulher que desce dos outeiros

Traz no seu colo um ramo dessa casa
Festiva onde vem desaguar
O rio sagrado deste vento

No soalho o silêncio derramado
Ou o sangue das palavras que caíram
Sob a face de uma voz que não gritou

No altar as mulheres bordam incenso
Celebram as canções com que embalaram
Os filhos O Deus A vida inteira

II

Casa de Deus

Os homens trazem na cintura velhas ânforas
Querem enchê-las de luz e de silêncio
Só há água nessa casa os homens partem
Não virão senão quando for noite

III

Mão sozinha que espera paciente
Como um berço convida a navegar

Um menino que tem velas mais vento
Virá um dia saber como é o mar

IV

Ouvem-se os cavalos já é noite
Os homens vêm vindimar
Os cabelos longos das mulheres
Que vieram orar pela manhã

Corre! - escrevem nas paredes
Os meninos

Corre!

Escrevem em segredo como quem
Rouba flores p'ra levar às mãos de Deus

V

Eis aberto espaço aberto
A sílaba interior de um nome imberbe

Casa de Deus
A casa das crianças que cresceram
Ou a casa das crianças para sempre

Longos degraus tem a primavera
E uma casa
A de Deus no cimo dos outeiros


(in Legenda para uma casa habitada, Paroquia de Santa Marinha de Fornos (Marco de Canavezes), 2000)

1 comentário:

Parapeito disse...

..gosto da ideia... da casa das crianças para sempre...e a casa de Deus no cimo dos outeiros :)