DESESPERO
(5 desenhos de ROGÉRIO RIBEIRO, num livro oferecido pelo
Amadeu Baptista)
I
É impossível saber
Quantos nomes temos
Num só corpo.
Impossível também a voz
Que ama, a mão que toca,
Tudo, todos, sempre,
Alterando timbres,
Deixando suceder as cores
Constatando a impossibilidade.
II
O desequilíbrio acontece
Sempre em nós próprios
Na presença do outro,
De quem ali está, incerto,
Presença a confirmar
Ausência. O vazio
Alheio a nós, do outro lado
Do desamparo. E o corpo
A não saber chegar ao chão.
III
A ânsia de alguma coisa,
Nada, a sede de ter
Um rosto visível. Não
O quase limite de estarmos
Todos
Debaixo do mesmo céu,
Dentro de uma esquadria
Demasiado exígua. Não
Apenas a sobrevivência.
IV
Não perceber, não reconhecer
Quem, quantos de nós
Estamos vivos. Desejar
A forma do próprio rosto
Ainda – até quando? –,
Para não a perder. Esticar
Os braços
Como quem grita sabendo
Que nunca será ouvido.
V
Ainda o rosto, ainda
A forma dele
Simplificada à margem
De uma fuga ou
Vislumbre de ausência.
O nada de um corpo
É não ser visto. Uma
E outra são o mesmo,
Desconexas.
Desespero, 2003
Acrílico s/ papel
56 cm X 76 cm
(reproduzidos a partir de Rogério Ribeiro / Desenho, Galeria
Municipal de Montemor-o-Novo, 2005)
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