LUÍS AMORIM DE SOUSA
(...)
Eu nem queria acreditar que estava a conversar com Pablo Neruda e como num desabafo, contei-lhe que tinha começado a ler a sua obra em Moçambique, mas que os seus livros estavam proibidos e eram difíceis de encontrar. Contei-lhe ainda que um amigo meu tinha arranjado um exemplar do Canto General e que, com todo o cuidado para não darmos nas vistas, eu e outros companheiros íamos espaçadamente a casa dele, para ler o poema à sucapa. Neruda olhou para mim com uma expressão que não esqueço e pôs a mão no meu braço.
- A história que acabou de me contar, foi-me contada mais vezes. Aconteceu também noutros países e quase sempre com jovens. É uma coisa que se repete ao longo da minha vida e que me deixa sempre emocionado.
E o grande Pablo Neruda agradeceu-me.
Depois falou de Salazar, que acusou de abafar a cultura portuguesa e disse que o considerava cabalmente responsável pelo isolamento mundial dos nossos poetas. Bebendo um trago de vinho perguntou se conhecíamos os vinhos do seu país. Tivemos que admitir que não e, sorrindo, Neruda comentou que por esse isolamento não poderia culpar o ditador Salazar.
(...)(excerto de Londres e Companhia, Assírio & Alvim, 2004)
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