ANTÓNIO RAMOS ROSA
A S. JOÃO DA CRUZ
Por uma secreta escada
desceste ao nocturno horto
onde encontraste o Amado
pastor de invioláveis graças
entre perfumadas nascentes.
Sem arrimo e com rumo
da tua cegueira vidente
te consumaste no centro
da divindade obscura,
alma e amor conjugados.
Num cego e escuro salto
subiste e logo desceste
para de novo subires
à indizível essência
de um não sei quê misterioso
ao qual, inteiro, te rendeste.
Pão vivo e fonte eterna
chamaste ao fruto escondido
que o teu desejo aspirava
e nele encontraste guarida
mesmo dentro da noite.
Sabias não haver caminho
para chegar a essa fonte
de que a origem não sabias
e que de tudo era origem
e a que chegaste num lance.
Toda a ciência transcendias
sem entender entendendo
e no puro imo bebias
o sol da profunda noite
em divina companhia.
Nada mais te contentava
que a vida da tua vinha
que lá no alto pairava
e lá no fundo ardia
com o rosto da formosura.
Chegaste aonde não eras
por onde não eras foste,
sempre às escuras na noite
até esse não sei quê
que é a existência da Vida.
(de Os Signos da Amizade, edições Asa, 2004 - colecção pequeno formato)
POEMS FROM THE PORTUGUESE
Há 2 horas
1 comentário:
belíssimo, rui.
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