3.4.11

EDIMILSON DE ALMEIDA PEREIRA


HISTÓRIA ANTI-NATURAL

HOMEM BALA


Um emprego não basta
para sanar as dívidas.
Quanto mais ajusto
tanto preciso ajuntar.
Quando paro, tudo
em mim trabalha.
E já uma outra dívida,
crescendo no sujo
da antiga, se anuncia.
Mal desço na praça
um braço me cobra,
outros me olham.
Tudo em mim se rala.
O que sobra gera
outra promissória.

HOMEM GOL

Falhar é um direito,
em meu caso, um caos.
Se me ausento do lance
é como se acabasse
o gás para o almoço.
Cada boca tem a fome
do juízo final até que o
juiz apite: acabou.
O jogo agora se disputa
mesmo sem partida.
Não há dono do time,
bola também não há.
A tática minha e sua
é atacar na defensiva.

HOMEM MOSCA

Para lições de leveza
nada mais que o corpo.
Se possível um anúncio
em que a sorte nos
convide à sua fazenda.
Para se manter no ar
é preciso músculos
e alguma tolerância.
Nossa natureza é pedra,
se muito, espuma.
Mas não será absurdo
flutuar na palavra
uma vez e outras.

HOMEM RÃ

O início do mergulho
está na ausência da água.
Quando tudo é esgoto
como achar o que se busca:
um braço e um dejeto
são uma só carcaça.
Recuperamos as coisas
em partes e com isso
a luta se reapresenta.
Num braço o corpo,
num chassi a máquina
que o precipitou no rio.
Mergulhar é dar início
a um quebra-cabeças.

HOMEM NU

A mão que me devassa
não colhe senão
fiascos de um tecido.
Há muito me imprimo
em formas anuladas.
As que têm medo
e, sendo muitas, vão
sozinhas ao labirinto.
Onde não há marcas
vigem meus dedos.
O nome que ostento
é um clã de anônimos
associados & filhos.

(in Oiro de Minas a nova poesia das Gerais, selecção de Prisca Agustoni, Ardósia, 2007 - colecção Pasárgada)

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