23.2.04

JOSÉ AFONSO

Sou um homem comum e não quero que me transformem numa vedeta.
(...)
As pessoas estão contaminadas por um gosto que lhes é fornecido, que lhes é imposto e fixa, na verdade, as preferências da maioria. Torna-se urgente reagir, contribuir para uma higienização desse gosto.
(...)
Encaro tudo por um prisma bastante lúdico. Estou sempre a pensar que, em breve, deixarei de cantar para fazer outra coisa qualquer. De resto, dedico-me a música com menos gosto do que, por exemplo, ao desporto.


(excertos de entrevista concedida a Daniel Ricardo e a Cáceres Monteiro, publicada em Cena 7, suplemento de A Capital, em 26 de Dezembro de 1970)

JCV - (...) tu és uma espécie de vedeta antivedeta. Isso é só natural, ou também cultivas um bocado esse ar e certo tipo de atitudes?
JA - Se queres que te diga, já nem sei. Na minha idade achas que existe alguma coisa completamente natural? Quando somos obrigados a reflectir sobre alguma coisa que à partida fazemos, ficamos cheios de dúvidas. A princípio abria as goelas e cantava... Depois começamos a reflectir. Aliás, aqui temos muita tendência para isso. Esta necessidade que temos d nos abastecer teoricamente, julgo que não a encontramos, por exemplo, nos cantores brasileiros - que, se calhar fazem coisas melhores que nós...

JCV - Continuas a não saber música?
JA - Continuo.
JCV - Como consegues então compor as músicas digamos, mais ricas, elaboradas, de certo modo complexas, dos teus últimos discos?
JA - São coisas que em parte estão na minha cabeça e noutra resultam da colaboração de pessoas que têm muito gosto e muito ouvido - uma delas é o Fausto, outra o Júlio Pereira, que tem percebido muito bem o meu trabalho. Faço uma espécie de estruturas mentais primárias e depois vou-as combinando.

(excertos de entrevista concedida a José Carlos Vasconcelos, publicada no jornal Se7e, em 22 de Abril de 1980)

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