O Tiago foi a primeira pessoa que conheci por causa dos blogues. Gosto muito do que ele diz e de como o diz.
Aquilo que muitos pensam ser mero exercício de ironia é, na verdade, a prática de uma honestidade e sinceridade que vão muito para lá da simples resistência ao politicamente correcto.
Quando fala da sua suburbanidade ou quando se compara a Saddam Hussein dizendo que podia ser tão mau quanto ele, o Tiago apenas está humildemente a demonstrar a sua lucidez evangélica.
O Tiago é um verdadeiro profeta, como é necessário que sejam todos os cristãos.
A Voz do Deserto completou esta semana um ano de emissões.
7.3.04
[as Torneiras recanalizaram-se para o local de origem. Convocam-se os GNR, para marcar o evento (ainda que com atraso...)]
FREUD & ANA
Mão morta/Mãe morta
Vai bater àquela porta
"Que se lixe quem não dança"
(disse Carl Jung)
É o século XX/
É o sexo vintage
A nossa doença, a nossa militância
É há cá quem sofra de complexos
E quem se queixe de SIDA
Mesmo de novas misturas
Em casais de pombos
E há cada vez mais novos combos
E até electro-choques
Insulina a rodos e outros mentais retoques
Querida,
Apareces-me em sonhos
Com penas de gato e muita comida
Que não te falte nada
Mesmo assim vestida
A tua líbido é mistura
De desejo e bebida
Como a cabeça do bispo
Tu comes a cabeça da dama
Vendo-te o "cavalo"
Empresto-te a torre
Mas quero saber que me ataca
Atropelo um peão
Juro que ele não morre
Baby eu sei que não sente
Liebschen ele nem trabalha
Não come não sente
Já não se lembra quem é...
E o luar é tão cândido
E eu e tu Ana tudo é pureza e limpeza
E era tudo tão claro
E agora é tudo tão vago
Tudo gente tão podre
E há uma assimetria
Com um toque de lobotomia
Ó miss Psicanálise - Que perfeita que és
E tão pequenina
Com umbigo e tudo - E até unhas nos pés
Que saúde que tens!
(Como eu a invejo)...
Que perfeita que és da cabeça aos pés!
(do álbum Os Homens não se Querem Bonitos, de 1985 - Letra e Música: Rui Reininho, Alexandre Soares, Jorge Romão e Toli)
FREUD & ANA
Mão morta/Mãe morta
Vai bater àquela porta
"Que se lixe quem não dança"
(disse Carl Jung)
É o século XX/
É o sexo vintage
A nossa doença, a nossa militância
É há cá quem sofra de complexos
E quem se queixe de SIDA
Mesmo de novas misturas
Em casais de pombos
E há cada vez mais novos combos
E até electro-choques
Insulina a rodos e outros mentais retoques
Querida,
Apareces-me em sonhos
Com penas de gato e muita comida
Que não te falte nada
Mesmo assim vestida
A tua líbido é mistura
De desejo e bebida
Como a cabeça do bispo
Tu comes a cabeça da dama
Vendo-te o "cavalo"
Empresto-te a torre
Mas quero saber que me ataca
Atropelo um peão
Juro que ele não morre
Baby eu sei que não sente
Liebschen ele nem trabalha
Não come não sente
Já não se lembra quem é...
E o luar é tão cândido
E eu e tu Ana tudo é pureza e limpeza
E era tudo tão claro
E agora é tudo tão vago
Tudo gente tão podre
E há uma assimetria
Com um toque de lobotomia
Ó miss Psicanálise - Que perfeita que és
E tão pequenina
Com umbigo e tudo - E até unhas nos pés
Que saúde que tens!
(Como eu a invejo)...
Que perfeita que és da cabeça aos pés!
(do álbum Os Homens não se Querem Bonitos, de 1985 - Letra e Música: Rui Reininho, Alexandre Soares, Jorge Romão e Toli)
REVISTA DE BLOGS IMAGINÁRIOS:
· O Na paz dos reis propõe a continuação da Panóplia do fetichista cinéfilo, mas só com filmes lusófonos:
101 - Fato aos losangos ("A dança dos paroxismos", Jorge Brum do Canto)
102 - Boneco de ventríloquo ("O grande Elias", Arthur Duarte)
103 - Sapatos brancos ("Ópera do malandro", Ruy Guerra)
104 - Lupa ("A Comédia de Deus", João César Monteiro)
105 - Luvas sujas de sardinhas ("Tráfico", João Botelho)
· No Velho cinema de réprise, a Rita revê a sua história.
· No Geórgicas & Bucólicas, o Virgílio conta que foi ao McDonalds do Chiado comer um GreekMac e foi atendido por uma rapariga chamada Eneida.
· O Figuras com estilo apresenta exemplos de pleonasmos onde se repete a mesma ideia:
- endereço de e-mail electrónico;
- líquido fluído;
- os clássicos: subir para cima, descer para baixo, entrar para dentro e sair para fora;
- falantes de língua lusófona;
- subscrevo por baixo.
· No Nada a aclarar considera-se despropositada e inoportuna (além de atrasada 3 dias) a evocação d'oblogsobrekleist pelo Ruialme.
· O Na paz dos reis propõe a continuação da Panóplia do fetichista cinéfilo, mas só com filmes lusófonos:
101 - Fato aos losangos ("A dança dos paroxismos", Jorge Brum do Canto)
102 - Boneco de ventríloquo ("O grande Elias", Arthur Duarte)
103 - Sapatos brancos ("Ópera do malandro", Ruy Guerra)
104 - Lupa ("A Comédia de Deus", João César Monteiro)
105 - Luvas sujas de sardinhas ("Tráfico", João Botelho)
· No Velho cinema de réprise, a Rita revê a sua história.
· No Geórgicas & Bucólicas, o Virgílio conta que foi ao McDonalds do Chiado comer um GreekMac e foi atendido por uma rapariga chamada Eneida.
· O Figuras com estilo apresenta exemplos de pleonasmos onde se repete a mesma ideia:
- endereço de e-mail electrónico;
- líquido fluído;
- os clássicos: subir para cima, descer para baixo, entrar para dentro e sair para fora;
- falantes de língua lusófona;
- subscrevo por baixo.
· No Nada a aclarar considera-se despropositada e inoportuna (além de atrasada 3 dias) a evocação d'oblogsobrekleist pelo Ruialme.
6.3.04
(Alberto Giacometti, estudo para Homem Caminhando)
MÁRIO RUI DE OLIVEIRA
O VENTO DA NOITE
De olhos cerrados, num autocarro, até me perder. Vazio, indigente, puro, regresso suplicando compaixão. É tarde. O crepúsculo já pronunciou o seu nome e não sei onde fica a minha casa.
Rente aos muros, coração descalço, persigo o vento da noite, o murmúrio de uma voz.
(de O Vento da Noite, Assírio & Alvim, 2002)
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5.3.04
[SONETOS À SEXTA-FEIRA]
GREGÓRIO DE MATTOS
Ao conde de Ericeira, D. Luiz de Meneses, pedindo louvores ao poeta, não lhe achando ele préstimo algum
Um sonêto começo em vosso gabo;
Contemos esta regra por primeira,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já êste quartetinho está no cabo.
Na quinta torce agora a porca o rabo:
A sexta vá também desta maneira,
Na sétima entro já com grã canseira,
E saio dos quartetos muito brabo.
Agora nos tercetos que direi?
Direi, que vós, Senhor, a mim me honrais,
Gabando-vos a vós, e eu fico um Rei.
Nesta vida um sonêto já ditei,
Se desta agora escapo, nunca mais;
Louvado seja Deus, que o acabei.
(fixação do texto de Gilberto Mendonça Teles)
OLAVO BILAC
VIA LÁCTEA
Em mim também, que descuidado vistes,
Encantado e aumentando o próprio encanto,
Teres notado que outras coisas canto
Muito diversas das que outrora ouvistes.
Mas amastes, sem dúvida... Portanto,
Meditai nas tristezas que sentistes:
Que eu, por mim, não conheço coisas tristes,
Que mais aflijam, que torturem tanto.
Quem ama inventa as penas em que vive:
E, em lugar de acalmar as penas, antes
Busca novo pesar com que as avive.
Pois sabei que é por isso que assim ando:
Que é dos loucos sòmente e dos amantes
Na maior alegria andar chorando.
ALPHONSUS DE GUIMARAENS
Estão mortas as mãos daquela Dona,
Brancas e quietas como o luar que vela
As noites romanescas de Verona,
E as barbacãs e tôrres de Castela...
No último gesto de quem se abandona
A morte esquiva, que apavora e gela,
As suas mãos de Santa e de Madona,
Inda postas em cruz, pedem por ela.
Uma esquecida sombra de agonias
Oscula o jaspe virginal das unhas,
E ao longo oscila das falanges frias...
E os dedos finos... ai! Senhora, ao vê-los,
Recordo-me da graça com que punhas
Um cravo, um lírio, um goivo entre os cabelos!
JORGE DE LIMA
MISSÃO E PROMISSÃO
Não a vaga palavra, corruptela
vã, corrompida folha degradada,
de raiz deformada, abaixo dela,
e de vermes, além, sobre a ramada;
mas, a que é a própria flor arrebatada
pela fúria dos ventos: mas aquela
cujo pólen procura a chama iriada,
- flor de fogo a queimar-se como vela;
mas aquela dos sopros afligida,
mas ardente, mas lava, mas inferno,
mas céu, mas sempre extremos. Esta sim,
esta é que é a flor das flores mais ardida,
esta veio do início para o eterno,
para a árvore da vida que há em mim.
VINICIUS DE MORAES
SONÊTO DO GATO MORTO
Um gato vivo é qualquer coisa linda
Nada existe com mais serenidade
Mesmo parado ele caminha ainda
As selavas sinuosas da saudade
De ter sido feroz. À sua vinda
Altas correntes de eletricidade
Rompem do ar as lâminas em cinza
Numa silenciosa tempestade.
Por isso ele está sempre a rir de cada
Um de nós, e ao morrer perde o veludo
Fica torpe, ao avesso, opaco, torto
Acaba, é o antigato; porque nada
Nada parece mais com o fim de tudo
Que um gato morto.
MARIA ÂNGELA ALVIM
A PEREGRINA
Calma, sim, acostumada
ao teu convívio constante
és a pessoa encontrada
sendo eterna itinerante.
Passas na comum estrada
e só tu passas durante
a multidão variada
de rostos para o levante.
Às vezes paras na estância
sem nenhum morno cansaço
de quem caminha com ânsia.
Entendes de todo engano
e fazes virar o passo
com tu pífaro indiano.
CARLOS PENA FILHO
SONETO DAS DEFINIÇÕES
Não falarei de coisas, mas de inventos
e de pacientes buscas no esquisito.
Em breve, chegarei à cor do grito
à música das cores e dos ventos.
Multiplicar-me-ei em mil cinzentos
(desta maneira, lúcido, me evito)
e a estes pés cansados de granito
saberei transformar em cataventos.
Daí, o meu desprezo a jogos claros
e nunca comparados ou medidos
como estes meus, ilógicos, mas raros.
Daí também, a enorme divergência
entre os dias e os jogos, divertidos
e feitos de beleza e improcedência.
LUPE COTRIM GARAUDE
DESTINO MINERAL
Sou feita de uma carne perecível
futuro de outra carne, sem nenhuma
eternidade. A rocha é uma invencível
parte da terra; que ela me resuma
no seu mesmo destino mineral.
A solidez ausente que tortura
nossa matéria frágil, no final
se renderá: serei de pedra dura.
Nunca mais chorarei nessa passagem
de poesia. Com nítida certeza,
recorto nas montanhas minha imagem
mais que raiz, expressa na beleza.
Pela terra em que não me desfiguro,
hei de surgir um dia em cristal puro.
STELLA LEONARDOS
HARPEJOS
Qualquer coisa de terno e eterno encanto
deste canto em que estamos nos transcende,
um fresco germinado por manhãs
de pássaros que passam pelo ar cedo,
flagrante deflagrar virgem fragrância,
rufar de asas passantes pluma e seda.
Antes que haja plateia deste instante
já lhe doamos o nosso pensamento.
Cálido, o coração atinge um plano
de surdina nos tons ternura plena
onde entre vós e nós não vai distância
mas a saudade só calada e assente.
Àqueles em que calam acalantos
calor desse cantar feito acalento.
GREGÓRIO DE MATTOS
Ao conde de Ericeira, D. Luiz de Meneses, pedindo louvores ao poeta, não lhe achando ele préstimo algum
Um sonêto começo em vosso gabo;
Contemos esta regra por primeira,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já êste quartetinho está no cabo.
Na quinta torce agora a porca o rabo:
A sexta vá também desta maneira,
Na sétima entro já com grã canseira,
E saio dos quartetos muito brabo.
Agora nos tercetos que direi?
Direi, que vós, Senhor, a mim me honrais,
Gabando-vos a vós, e eu fico um Rei.
Nesta vida um sonêto já ditei,
Se desta agora escapo, nunca mais;
Louvado seja Deus, que o acabei.
(fixação do texto de Gilberto Mendonça Teles)
OLAVO BILAC
VIA LÁCTEA
Em mim também, que descuidado vistes,
Encantado e aumentando o próprio encanto,
Teres notado que outras coisas canto
Muito diversas das que outrora ouvistes.
Mas amastes, sem dúvida... Portanto,
Meditai nas tristezas que sentistes:
Que eu, por mim, não conheço coisas tristes,
Que mais aflijam, que torturem tanto.
Quem ama inventa as penas em que vive:
E, em lugar de acalmar as penas, antes
Busca novo pesar com que as avive.
Pois sabei que é por isso que assim ando:
Que é dos loucos sòmente e dos amantes
Na maior alegria andar chorando.
ALPHONSUS DE GUIMARAENS
Estão mortas as mãos daquela Dona,
Brancas e quietas como o luar que vela
As noites romanescas de Verona,
E as barbacãs e tôrres de Castela...
No último gesto de quem se abandona
A morte esquiva, que apavora e gela,
As suas mãos de Santa e de Madona,
Inda postas em cruz, pedem por ela.
Uma esquecida sombra de agonias
Oscula o jaspe virginal das unhas,
E ao longo oscila das falanges frias...
E os dedos finos... ai! Senhora, ao vê-los,
Recordo-me da graça com que punhas
Um cravo, um lírio, um goivo entre os cabelos!
JORGE DE LIMA
MISSÃO E PROMISSÃO
Não a vaga palavra, corruptela
vã, corrompida folha degradada,
de raiz deformada, abaixo dela,
e de vermes, além, sobre a ramada;
mas, a que é a própria flor arrebatada
pela fúria dos ventos: mas aquela
cujo pólen procura a chama iriada,
- flor de fogo a queimar-se como vela;
mas aquela dos sopros afligida,
mas ardente, mas lava, mas inferno,
mas céu, mas sempre extremos. Esta sim,
esta é que é a flor das flores mais ardida,
esta veio do início para o eterno,
para a árvore da vida que há em mim.
VINICIUS DE MORAES
SONÊTO DO GATO MORTO
Um gato vivo é qualquer coisa linda
Nada existe com mais serenidade
Mesmo parado ele caminha ainda
As selavas sinuosas da saudade
De ter sido feroz. À sua vinda
Altas correntes de eletricidade
Rompem do ar as lâminas em cinza
Numa silenciosa tempestade.
Por isso ele está sempre a rir de cada
Um de nós, e ao morrer perde o veludo
Fica torpe, ao avesso, opaco, torto
Acaba, é o antigato; porque nada
Nada parece mais com o fim de tudo
Que um gato morto.
MARIA ÂNGELA ALVIM
A PEREGRINA
Calma, sim, acostumada
ao teu convívio constante
és a pessoa encontrada
sendo eterna itinerante.
Passas na comum estrada
e só tu passas durante
a multidão variada
de rostos para o levante.
Às vezes paras na estância
sem nenhum morno cansaço
de quem caminha com ânsia.
Entendes de todo engano
e fazes virar o passo
com tu pífaro indiano.
CARLOS PENA FILHO
SONETO DAS DEFINIÇÕES
Não falarei de coisas, mas de inventos
e de pacientes buscas no esquisito.
Em breve, chegarei à cor do grito
à música das cores e dos ventos.
Multiplicar-me-ei em mil cinzentos
(desta maneira, lúcido, me evito)
e a estes pés cansados de granito
saberei transformar em cataventos.
Daí, o meu desprezo a jogos claros
e nunca comparados ou medidos
como estes meus, ilógicos, mas raros.
Daí também, a enorme divergência
entre os dias e os jogos, divertidos
e feitos de beleza e improcedência.
LUPE COTRIM GARAUDE
DESTINO MINERAL
Sou feita de uma carne perecível
futuro de outra carne, sem nenhuma
eternidade. A rocha é uma invencível
parte da terra; que ela me resuma
no seu mesmo destino mineral.
A solidez ausente que tortura
nossa matéria frágil, no final
se renderá: serei de pedra dura.
Nunca mais chorarei nessa passagem
de poesia. Com nítida certeza,
recorto nas montanhas minha imagem
mais que raiz, expressa na beleza.
Pela terra em que não me desfiguro,
hei de surgir um dia em cristal puro.
STELLA LEONARDOS
HARPEJOS
Qualquer coisa de terno e eterno encanto
deste canto em que estamos nos transcende,
um fresco germinado por manhãs
de pássaros que passam pelo ar cedo,
flagrante deflagrar virgem fragrância,
rufar de asas passantes pluma e seda.
Antes que haja plateia deste instante
já lhe doamos o nosso pensamento.
Cálido, o coração atinge um plano
de surdina nos tons ternura plena
onde entre vós e nós não vai distância
mas a saudade só calada e assente.
Àqueles em que calam acalantos
calor desse cantar feito acalento.
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4.3.04
3.3.04
MANUEL VÁSQUEZ MONTALBÁN
Después ya salió Mao y el sexy.
Y por entonces empezaba a escribir yo.
En mis primeros versos pedía libertad, pan, justicia, enseñanza gratuita y amor libre (yo en mi adolescencia era un tigre de papel y muy reformista).
Ahora escribo como si fuera idiota, única actitud lúcida que puede consentirse un intelectual sometido a una organización de la cultura precariamente neocapitalista.
La cultura y la lucidez llevan a la subnormalidad.
Aprovecho esta oportunidad para pedir una beca estatal por hipersensible.
Este año el Barça ganará la Liga. Eugeni Trías conseguirá una alienación característica: Sadurní; Torres, Gallego, Eladio; Rifé, Zabalza; Rexach, Marcial Bustillo, Fusté y Pujol.
Cuando cambien las cosas entonces cambiaré de creencias estéticas. De momento éstas me han costado mucho de adquirir. Tal vez me esté mal el decirlo, pero un servidor no le debe nada a nadie y puede caminar com la cabeza muy alta.
(excerto de Poética, incluído na antologia Nueve Novísimos Poetas Españoles, organizada por J. M. Castellet - editada por Barral editores em 1970 e reeditada, em 2001, pelas ediciones Península)
Después ya salió Mao y el sexy.
Y por entonces empezaba a escribir yo.
En mis primeros versos pedía libertad, pan, justicia, enseñanza gratuita y amor libre (yo en mi adolescencia era un tigre de papel y muy reformista).
Ahora escribo como si fuera idiota, única actitud lúcida que puede consentirse un intelectual sometido a una organización de la cultura precariamente neocapitalista.
La cultura y la lucidez llevan a la subnormalidad.
Aprovecho esta oportunidad para pedir una beca estatal por hipersensible.
Este año el Barça ganará la Liga. Eugeni Trías conseguirá una alienación característica: Sadurní; Torres, Gallego, Eladio; Rifé, Zabalza; Rexach, Marcial Bustillo, Fusté y Pujol.
Cuando cambien las cosas entonces cambiaré de creencias estéticas. De momento éstas me han costado mucho de adquirir. Tal vez me esté mal el decirlo, pero un servidor no le debe nada a nadie y puede caminar com la cabeza muy alta.
(excerto de Poética, incluído na antologia Nueve Novísimos Poetas Españoles, organizada por J. M. Castellet - editada por Barral editores em 1970 e reeditada, em 2001, pelas ediciones Península)
2.3.04
[Nuvens...]
JOHANN WOLFGANG GOETHE
Domingo, 30 de Abril, Karlsbad
O velho jogo das nuvens a dissipar-se e a engrossar, mas sem resultados visíveis.
(de O Jogo das Nuvens, selecção, tradução, prefácio e notas de João Barrento, Assírio & Alvim, 2003 - Gato Maltês)
JOSÉ MÁRIO SILVA
curriculum vitae
Maternidade de Port-Royal, dois de março de mil novecentos e setenta e dois, dez e vinte da manhã. O primeiro grito, o primeiro choro, a primeira luz nos olhos, o primeiro ar nos pulmões. Depois, o leite quente da mãe. Depois, fraldas, pó de talco, colheres de papa, banhos com bonecos de borracha. Depois, as primeiras letras, a tabuada, o quadro negro, o recreio, joelhos rasgados, as férias infinitas. Depois, o corpo a crescer, o mundo a aumentar, as coisas a ganharem outra espessura. Depois, uma teia de alegrias e dúvidas e escolhas e decepções e incertezas e recomeços e júbilos e esperanças, constelação que não desenha - ainda - qualquer figura.
(de Curriculum Vitae & Outros Poemas, incluído em A Semiologia Segundo Tarzan Taborda - Colectânea de textos de Jovens Criadores 2002, Clube Português de Artes e Ideias e Íman edições, 2003)
[...& labirintos]
JORGE LUÍS BORGES
O fio da fábula
O fio que a mão de Ariadne deixou na mão de Teseu (na outra estava a espada) para que este se aventurasse no labirinto e descobrisse o centro, o homem com cabeça de touro ou, como pretende Dante, o touro com cabeça de homem, e o matasse e pudesse, já executada a proeza, decifrar as redes de pedra e voltar para ela, para o seu amor.
As coisas aconteceram assim. Teseu não podia saber que do outro lado do labirinto estava o outro labirinto, o do tempo, e que num lugar já fixado estava Medeia.
O fio perdeu-se, o labirinto perdeu-se também. Agora nem sequer sabemos se nos rodeia um labirinto, um secreto cosmos ou um caos ocasional. O nosso mais belo dever é imaginar que há um labirinto e um fio. Nunca daremos com o fio; talvez o encontremos e o percamos num acto de fé, num ritmo, no sono, nas palavras que se chamam filosofia ou na mera e simples felicidade.
Cnossos, 1984.
(de Os Conjurados - tradução de Fernando Pinto do Amaral)
JOHANN WOLFGANG GOETHE
Domingo, 30 de Abril, Karlsbad
O velho jogo das nuvens a dissipar-se e a engrossar, mas sem resultados visíveis.
(de O Jogo das Nuvens, selecção, tradução, prefácio e notas de João Barrento, Assírio & Alvim, 2003 - Gato Maltês)
JOSÉ MÁRIO SILVA
curriculum vitae
Maternidade de Port-Royal, dois de março de mil novecentos e setenta e dois, dez e vinte da manhã. O primeiro grito, o primeiro choro, a primeira luz nos olhos, o primeiro ar nos pulmões. Depois, o leite quente da mãe. Depois, fraldas, pó de talco, colheres de papa, banhos com bonecos de borracha. Depois, as primeiras letras, a tabuada, o quadro negro, o recreio, joelhos rasgados, as férias infinitas. Depois, o corpo a crescer, o mundo a aumentar, as coisas a ganharem outra espessura. Depois, uma teia de alegrias e dúvidas e escolhas e decepções e incertezas e recomeços e júbilos e esperanças, constelação que não desenha - ainda - qualquer figura.
(de Curriculum Vitae & Outros Poemas, incluído em A Semiologia Segundo Tarzan Taborda - Colectânea de textos de Jovens Criadores 2002, Clube Português de Artes e Ideias e Íman edições, 2003)
[...& labirintos]
JORGE LUÍS BORGES
O fio da fábula
O fio que a mão de Ariadne deixou na mão de Teseu (na outra estava a espada) para que este se aventurasse no labirinto e descobrisse o centro, o homem com cabeça de touro ou, como pretende Dante, o touro com cabeça de homem, e o matasse e pudesse, já executada a proeza, decifrar as redes de pedra e voltar para ela, para o seu amor.
As coisas aconteceram assim. Teseu não podia saber que do outro lado do labirinto estava o outro labirinto, o do tempo, e que num lugar já fixado estava Medeia.
O fio perdeu-se, o labirinto perdeu-se também. Agora nem sequer sabemos se nos rodeia um labirinto, um secreto cosmos ou um caos ocasional. O nosso mais belo dever é imaginar que há um labirinto e um fio. Nunca daremos com o fio; talvez o encontremos e o percamos num acto de fé, num ritmo, no sono, nas palavras que se chamam filosofia ou na mera e simples felicidade.
Cnossos, 1984.
(de Os Conjurados - tradução de Fernando Pinto do Amaral)
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prosa
1.3.04
[porque não é todos os dias que um pseudónimo famoso faz anos]
A 11 de Fevereiro de 1856, anotou Charles Dodgson no seu Diário: «escrevi a Mr. Yates para propor-lhe diversas possibilidades de nomes: 1. Edgar Cuthwellis (construído por transposição das letras de "Charles Lutwidge"). 2. Edgar U. C. Westhill (idem). 3. Louis Carroll (derivado de Lutwidge = Ludovic = Louis e de Charles (Carolus). 4. Lewis Caroll (idem).» Em 1 de Março acrescentou esta observação: «Lewis Carroll foi o escolhido.»
(excerto do Prefácio de João Costa a Sylvie e Bruno, de Carrol)
A 11 de Fevereiro de 1856, anotou Charles Dodgson no seu Diário: «escrevi a Mr. Yates para propor-lhe diversas possibilidades de nomes: 1. Edgar Cuthwellis (construído por transposição das letras de "Charles Lutwidge"). 2. Edgar U. C. Westhill (idem). 3. Louis Carroll (derivado de Lutwidge = Ludovic = Louis e de Charles (Carolus). 4. Lewis Caroll (idem).» Em 1 de Março acrescentou esta observação: «Lewis Carroll foi o escolhido.»
(excerto do Prefácio de João Costa a Sylvie e Bruno, de Carrol)
[personagens recorrentes I]
CHARLES SIMIC
ÁLGEBRA DO INÍCIO DA NOITE
A louca prosseguia desenhando Xs
Com um pau de giz escolar
Nas costas de pares inadvertidos,
De mãos dadas rumo a casa.
Era inverno. Já escurecera.
Não se conseguia ver-lhe a cara,
Embuçada como estava e furtiva
Como se fosse levada pelo vento, com asas de corvo.
O giz ter-lhe-ia sido dado por uma criança.
Tentava-se descobri-la na multidão,
Esperando que fosse muito séria, muito pálida,
Com uma lasca de ardósia negra no bolso.
(in Previsão de Tempo para Utopia e Arredores, tradução de José Alberto Oliveira, Assírio & Alvim, 2002)
JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
TEOREMA
Diante do espelho vê rostos além do seu
e a loucura é reconhecê-los entre os mortais
esses rostos silenciosos e esquivos
tão fácil seria chamá-los
celestes
Mas ela era terrena tão por terra
conduzia a ondulação dos sentimentos
não a entendem?
Ela deixava quebrar os vasos só para os ouvir
porque tudo tem uma voz mesmo as coisas mudas
e o silêncio é uma ímpia forma de desobediência
Ela marcava um por um
Umbrais códices colheres
Para que tudo estivesse unido
Sob o frio ordenado do visível
De noite porém afundava-se no lago
e lá adormecia
De noite levava a espingarda à janela
e ficava a ouvir não os tiros
mas o incrível silêncio que sucede a cada tiro
De noite dizia-se vacilante e perdida
Depois vinha o dia e a rasura
a repetida ordenação que os acentos concedem
às palavras
a quase paixão que jamais tocava os seres
sempre só a sua representação
(de Longe Não Sabia, Presença, 1997 - colecção forma)
CHARLES SIMIC
ÁLGEBRA DO INÍCIO DA NOITE
A louca prosseguia desenhando Xs
Com um pau de giz escolar
Nas costas de pares inadvertidos,
De mãos dadas rumo a casa.
Era inverno. Já escurecera.
Não se conseguia ver-lhe a cara,
Embuçada como estava e furtiva
Como se fosse levada pelo vento, com asas de corvo.
O giz ter-lhe-ia sido dado por uma criança.
Tentava-se descobri-la na multidão,
Esperando que fosse muito séria, muito pálida,
Com uma lasca de ardósia negra no bolso.
(in Previsão de Tempo para Utopia e Arredores, tradução de José Alberto Oliveira, Assírio & Alvim, 2002)
JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
TEOREMA
Diante do espelho vê rostos além do seu
e a loucura é reconhecê-los entre os mortais
esses rostos silenciosos e esquivos
tão fácil seria chamá-los
celestes
Mas ela era terrena tão por terra
conduzia a ondulação dos sentimentos
não a entendem?
Ela deixava quebrar os vasos só para os ouvir
porque tudo tem uma voz mesmo as coisas mudas
e o silêncio é uma ímpia forma de desobediência
Ela marcava um por um
Umbrais códices colheres
Para que tudo estivesse unido
Sob o frio ordenado do visível
De noite porém afundava-se no lago
e lá adormecia
De noite levava a espingarda à janela
e ficava a ouvir não os tiros
mas o incrível silêncio que sucede a cada tiro
De noite dizia-se vacilante e perdida
Depois vinha o dia e a rasura
a repetida ordenação que os acentos concedem
às palavras
a quase paixão que jamais tocava os seres
sempre só a sua representação
(de Longe Não Sabia, Presença, 1997 - colecção forma)
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