15.2.05

[fatal como eu, na Terra da Alegria de Hoje]

SÉRGIO GODINHO

CASO FATAL

É a mais pura verdade o caso que eu vou contar
quem quiser pode nem acreditar

Sé bem que, aviso já
mentiroso eu não sou
quem quiser pode ir lá ver
que eu não vou.
De mais a mais porque é
que eu havia de ir ver
o que já lá vi com estes dois
por quem sois
crêde em mim
vou contar-vos enfim
o tal caso verdadeiro:
aí vai, tim-tim por tim-tim

Verdadeiro ou não
só posso chamar-lhe atroz
este caso que me estrangula a voz

Não penseis que exagero
nem julgueis que é demais
ou que abuso de pimentas e sais

Não, bem pelo contrário
a minha musa indigente
nem sequer está à altura
e faz figura bem triste
mas bom, já que se insiste
estou disposto a revelar
no que este caso consiste

Ora bem foi assim
este caso fatal
que foi p'ra pior
depois de estar mal

Não me lembro da hora
nem se era noite ou dia
só sei que algo no ar se pressentia

E os pressentimentos
são a modos que mosquitos
a esvoaçarem no ar
esmagar dois ou três
se alivia o freguês
não anula o problema
nem o resolve de vez

Então seguiu-se o resto
do que estava p'ra vir
nem vos conto, p'ra vos não combalir

Foi um ver se te avias
um vai-vem muito louco
um toma-lá-dá-cá e fica com o troco

Teve um pouco de tudo
e foi pouco p'ro que teve
sem ter mais nem porquê
já se vê p'lo aparato
que foi de esfola-gato
este caso que no meu modesto verso relato

Bem, e agora que já
estais familiarizados
com o assunto e seus assins e assados
e que tendes presente
a complexidade
de apartar do mexerico a verdade
podereis ter ficado
com a estranha sensação
que eu nada disse, e porém...

Também muitos doutores
falam bem fazem flores
mas não dizem nada, nada
ao discursar: Meus senhores...

(do álbum Coincidências, 1983)

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