28.8.05

(Diego Rodríguez de Silva y Velázquez - Los borrachos, 1629)


VICENTE ALEIXANDRE


«LOS BORRACHOS»

A solidão conjunta poucos deixa fora, e cai nos rostos.
Ali se vêem olhos excitados. Há muito sol, e cobre se diria
a tez de quase todos, couro curtido largamente. Terra?
Argila? O sangue gira. E quase transparece?
Mas não. Grossa é a pele, e sob a polegada, rotundo rubro estala,
carmesim. Não, mais vivo, álacre, oh sim: espirituoso.
E a face brilha, quase delira, a par dos dois olhos.
Bêbados os direis. E em cima são os pâmpanos
torcidos. E o barril. Desnudo um torso,
quase veríeis resvalar o vinho, veloz, quente
por um corpo, que se palpita é terra e anuncia.
Esta cabeça é prata. Pálida também muito junta cobre espessa,
protege o pensamento pobre que ali insiste.
Pobre porém bem fundo: quase um jacto de ouro até a uns lábios.
Vinho ardente. Gozai. A tarde é jovem.
Essa mão essa malga levanta transbordante.
A vide, e entre outros pâmpanos os olhos.
Uma jovial donzela escapa incógnita.

Eles não vêem. Se olham vêem bolhas.
Sob o azul molhado o Sol reparte
sumo ou raios por igual. Resvala
sobre os ombros, lambe os peitos, brilha em gotas vividas
entre as suas sombras. Banha total o corpo a chama e veste
de inflamada realidade os bustos.

Velásquez! Embora jovem pintou um conhecimento,
já entalhando com o pincel. Acreditou? Enganou-se?
Quem sabe! Ainda era preto o ar,
antes de que analítico se abrisse
o que na síntese final se alcance.

(tradução de António Manuel Couto Viana, in Por Outras Palavras, Vega, 1997)

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