18.2.07

FERNANDO GUEDES

O CAULE

III


Vinte e quatro vidas por segundo
alimentam a vida.
O ser impassível fia suas relações
e na sólida teia suporta a existência.
Intactas, as coordenadas definem
o fluir rítmico.
Move-se a paramécia oscilando
entre obstáculo e alimento.
A carraça, suspensa do arbusto,
espia sua vítima,
homem ou bicho.
A gralha aguarda inquieta
o salto do gafanhoto.
A toupeira defende o seu lar
e a pátria.
Tempo e espaço são obra do sujeito.

Na cidade, na planície,
a lâmina quebrada reconstrói-se.
Ataste-a com teus braços fechados,
alteia-la no vento - da brisa ao ciclone -
para a soltares num riso sem fulgor,
fundindo num só ocidente e oriente,
e lâmina e volante reprendem a máquina
e o carro e suas rodas se libertam
da humidade granítica.

Na sombra
centríolos e dictiossomas receosos
suspendem o seu curso enigmático.
Não há recuo ou progresso.
Contrai-se o espaço
e a suspensão forçou um arrepio
na terceira estrada do longo Paraíso.

(de Caule, Flor e Fruto, editorial Verbo, 1962)

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