RUI MANUEL AMARAL
O gato morto
Um homem batia num gato morto. Batia-lhe com toda a força, ventilando ao mesmo tempo os seus sentimentos de desprezo por meio dos piores insultos que jamais foram dirigidos a um gato. Ora, estando morto, o bicho evidentemente não reagia. Mas nem por isso o homem parecia disposto a parar. Pelo contrário: cada vez mais encarniçado, batia-lhe umas vezes nas costas, outras nas patas, outras no focinho, puxando-lhe outras vezes a cauda e os bigodes. Numa palavra, assentava-lhe bem as costuras. Isto prolongou-se durante longos minutos, só abrandando quando se sentiu fatigado e quando já não havia no corpo do bicho um lugar sequer que não estivesse macerado. Foi então que de repente o gato se lançou furiosamente sobre o homem e lhe esgadanhou a cara com tal ímpeto que só por um incrível rasgo de sorte lhe não arrancou o nariz e as orelhas.
(daqui)
Sem comentários:
Enviar um comentário