JORGE VELHOTE
PIAZZALE MICHELLANGELO
Silenciosos pássaros esmigalham sementes, espiam
a noite, o secreto labirinto das janelas, o regaço
da água que chameja a terra. Os herbáreos
celebram o ritual da botânica, as sombras, requintados
aromas que os estames de luz, delicadamente,
tecem. Há uma floresta
onde escrevo um momento, o abraço
do amigo, as praias, os animais
da infância. Vêm
com o perturbante olhar, nos tanques, junto à casa,
por entre a cúmplice dormência dos nenúfares, o fascínio
da água, beijam os peixes,
os meninos, com maldições no olhar e bibes muito azuis,
que arborescem no outono, surpreendentemente.
(in Orfeu 4, organização: Amadeu Baptista/Egito Gonçalves, Limiar, Dezembro 1988)
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