FERNANDO LANHAS
auto-retrato, 1973
JOSÉ VIALE MOUTINHO
HOMENAGEM AO PINTOR
FERNANDO LANHAS
1
dele é o grande livro dos astros
as linhas da idade pertencem-lhe
assim como todos os museus da terra
e o crânio do homem de cromagnon
vejamos as horas que restam no saber
do tempo nestes relógios de sol vivo
como evoluiu o linho o trigo o milho
quanto vale um minuto isolado por aí
como se passa da cor à ausência dela
no espelho das cinzas nos tecidos
o fogo acabado de descobrir os olhos
postos numa boneca de louça antiga
esquece-se das chaves do automóvel
as casas suspensas nos estiradores
uma porta que não existe ainda oca
tudo tão relativo como a ampulheta
2
servem-nos os melhores vinhos o
lápis
que traduz o chapéu de palha da
madeira
essa estrada por entre os
arvoredos
deus se existe vai no
porta-bagagens
adiante no tablier ninguém
escuta as
perdas e os danos o inquieto
barro
que se permite no largo de s. joão
novo
num palácio de nasoni entre
muralhas
de que me lembro e aonde devo
guardar
este barco dos anos trinta este
folheto
de monstros de há trezentos anos
a lua
naquele tempo não imaginava a
sua morte
quantas vezes voltamos ao lugar
onde
nem a sibila adivinharia as
sombras
com os nossos números de ordem
astros
de um universo perdido nas
palavras
(desenho e poema in Retrato de
Braços Cruzados, editorial Caminho, 1989)
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