OCTAVIO PAZ
QUATRO CHOUPOS
Como atrás de si mesma, vai esta linha
pelos horizontes confins se perseguindo,
e, no poente sempre fugitivo
em que se busca, se dissipa
- como esta mesma linha,
pelo olhar levantada,
forma todas as letras
numa coluna diáfana
resolvida em não tocada,
nem ouvida, nem degustada, mas pensada,
flor de vogais e consoantes
- como esta linha que não pára de se escrever,
e, antes de se consumar, reganha corpo,
sem cessar de fluir, mas p'ra cima:
os quatro choupos.
Aspirados
pela altura vazia, e, ali em baixo,
num charco feito céu, reduplicados,
os quatro são um só choupo,
e são choupo algum.
Atrás, copas em chamas
que se apagam - a tarde, à deriva -
outros choupos, feitos andrajos espectrais,
interminavelmente ondulam,
intermináveis, de imóveis.
O amarelo desliza para o rosa,
no violeta, a noite se insinua.
QUATRO CHOUPOS
Como atrás de si mesma, vai esta linha
pelos horizontes confins se perseguindo,
e, no poente sempre fugitivo
em que se busca, se dissipa
- como esta mesma linha,
pelo olhar levantada,
forma todas as letras
numa coluna diáfana
resolvida em não tocada,
nem ouvida, nem degustada, mas pensada,
flor de vogais e consoantes
- como esta linha que não pára de se escrever,
e, antes de se consumar, reganha corpo,
sem cessar de fluir, mas p'ra cima:
os quatro choupos.
Aspirados
pela altura vazia, e, ali em baixo,
num charco feito céu, reduplicados,
os quatro são um só choupo,
e são choupo algum.
Atrás, copas em chamas
que se apagam - a tarde, à deriva -
outros choupos, feitos andrajos espectrais,
interminavelmente ondulam,
intermináveis, de imóveis.
O amarelo desliza para o rosa,
no violeta, a noite se insinua.
Entre o céu e a água,
há franjas azuis e verdes:
sol e plantas aquáticas,
caligrafia flamejante,
escrita pelo vento.
É um reflexo, noutro suspenso.
Trânsitos: pestanejar do instante.
O mundo perde corpo,
é uma aparição, é quatro choupos,
quatro moradas melodias.
Frágeis ramos trepam pelos troncos.
São um pouco de luz, e outro tanto de vento.
Vaivém imóvel. Com os olhos,
oiço-os murmurar palavras de ar.
O silêncio segue com o ribeiro,
com o céu regressa.
É real o que vejo:
quatro choupos sem peso,
plantados em vertigem.
Uma fixidez que se precipita
para baixo, para cima,
para a água do céu do remanso,
num esbelto afã sem desenlace,
enquanto o mundo zarpa no obscuro.
Pulsar de claridades últimas:
quinze minutos confinados,
que Cláudio Monet viu de uma barca.
Na água, abisma-se o céu,
em si mesma se afunda a água,
o choupo é um tiro opalino:
não é sólido, este mundo.
Entre ser e não ser, a erva titubeia,
aligeiram-se elementos,
os contornos se esfumam,
lampejos, reflexos, reverberações,
cintilar de formas e presenças,
névoa de imagens, eclipses,
isto, que vemos: as miragens que somos.
(de Árvore Adentro, tradução de Luís Alves da Costa, Vega, 1994)
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