24.5.12

[outros melros LXV]  

MICHAEL HAMBURGER


Conversação com um melro

'Fazes favor, fazes favor, fazes favor'
começa ele, e eu espero o resto
que vem, indistinto e sem ênfase.
'Afasta-te', creio compreender,
ou 'deixa andar', posso ter ouvido ou não:
as vogais são confusas,
as consoantes faltam.
Oh, e o ritmo é livre
depois desse cortês pedido.

Traduzido, o meu assobio de resposta diz:
'Sê mais explícito. A nossa espécie não suporta
coisas incertas, canções com o fim em aberto.
Ser deixado a adivinhar é mais
do que aguentamos muito tempo.

Ri-se? 'Por favor, por favor, por favor'
é a resposta. E então coloratura, e nela estas frases:
'Eu repito, o fim não cito.
São mistérios, mistérios de cantor.
Improviso, o tempo aviso.
Ora subo, e ora piso.
E volito. Não hesito
se o indefinido imito.
E ora fito, chilrozito. Ora saltito.'


(tradução de Vasco Graça Moura, in Poesia em Lisboa 1997, Casa Fernando Pessoa e P.E.N. Clube Português, 1997)


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