26.2.06

FERNANDO ECHEVARRÍA

* * *


Por fim, era a lavoura que lhe retinha os anos.
Do jeito de os reter sobressaía
uma eira de luz. Aberta ao campo
de ver, quem sabe que compaixão antiga.
Ou, então, instalava-se-lhe um páramo
de nitidez longínqua
ao fundo da cegueira. Uma cegueira a quanto,
estando perto, o recolhia ainda
para um recuo de distracção sagrado
onde ficava a difundir-se a vista.
E, ao mesmo tempo, recrudescia o estado
de inteligência. Vinha
reconhecer-se no objecto. E o acto
do reconhecimento repetia
o mundo em todo o seu esplendor abstracto,
que era o concreto a alicerçar-se em vida.
Era o momento em que a lavoura, os pâmpanos,
e mesmo a canícula da quinta
lhe retinham a tez, a luz dos anos.
E aquele recuo de antevisão activa.

(in Literatura Portuguesa e Brasileira / Ano 2000, organização de João Almino e Arnaldo Saraiva, Comissão Nacional para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses, 2000)

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