MÁRIO CLÁUDIO
ESTANTE
1.
Encetamos o texto, três nódoas de gordura
no papel. Não somos gente de brincos, capas
de brocado, no balcão depondo um presente
de frutos e penas.
2.
Num sobressalto se inquiria o destino do livro,
o segredo por um dia nos afrontava.
No regaço o deixáramos de quem partira,
quando um vaso nos tapetes se entornara.
3.
O frasco de lavanda de lado a lado fracturara
o lavatório. Rasgara o cabedal do amuleto fula, com seu versículo inviolado do Corão. Dera depois por falta da minúscula caixa de Córdova. E a tradução de Sinisgalli, perdida entre que migalhas, «miraggi di fumo, castelli di carte»?
4.
Acumulamos os registos do saber, o futuro
lançado em sinuosos caracteres. A poeira
das mimosas sobre isso vai abatendo, longe
dos pintores de Siena. Que pode a morte
contra eles? E o carvão em que, dizem nos
convertemos?
(in tempo migratório - selecção de poesia portuguesa inédita, Limiar, 1985)
A «DANA» de que se fala
Há 25 minutos
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