4.8.09

MARQUESA DE ALORNA


QUANDO ME PENHORARAM INJUSTAMENTE TODOS OS MEUS BENS


À Fortuna


Fortuna, que me persegues,
Pequeno triunfo tens:
Eu desejo só vontades,
Tu disputas-me vinténs.
Basta-me o que me deixares,
Quando tudo me levares.

Basta-me esta alma que tenho,
Constante como os penedos;
Bastam-me as águas das fontes,
E a sombra dos arvoredos;
Ponho-me ao fresco no Estio,
E aquento-me, andando ao frio.

Basta-me o Sol, que não podes
Apagar, e à noite a Lua.
Se me tirares a casa,
Irei dormir para a rua.
Sopa, não me dá cuidado,
Tem muitas plantas o prado.

Se o teu rigor se estendesse
A tirar-me o meu tinteiro,
Escreveria nos troncos,
Com um prego, este letreiro:
«Vim ao mundo sem camisa,
Ninguém, morrendo, a precisa.»

(in Poesias, selecção, prefácio e notas do Prof. Hernâni Cidade, 2ª ed.: livraria Sá da Costa editora, 1960)

1 comentário:

cbs disse...

muito boa