JOSÉ MATTOSO
(excerto de «O Tempo de Santa Beatriz da Silva», in Santa Beatriz da Silva - Uma estrela para novos rumos, Princípia, 2013)
A humanidade atravessou muitas crises. A dos séculos XIV e XV é uma
daquelas em que, pelo menos na perspetiva católica, melhor se pode
entender o lado transcendente dos acontecimentos. Os dias em que
vivemos, nesta segunda década do segundo milénio, são também de crise.
Desconhecemos as suas dimensões e as suas consequências, mas parece ser
das mais graves que têm atingido a humanidade, porque é universal. As crises nacionais ou internacionais que abalaram o
mundo nos séculos passados acabaram por ser superadas. Algumas fizeram
muitas vítimas, mas também enriqueceram experiências de vida e ensinaram
a encontrar soluções realistas, eficazes e abrangentes. Aquela que aqui
tentei mostrar nas suas grandes linhas está praticamente esquecida, mas
merece ser recordada. Não trouxe só sofrimento e miséria. Trouxe também
ousadia, solidariedade, melhor conhecimento de Deus, fé, esperança e
caridade. Dela nasceram alguns santos conhecidos e venerados, como Santa
Beatriz, e muitos mais de quem ninguém fala, mas Deus conhece. Dela
brotaram muitas experiências de vida radical e, por isso, movimentos
renovadores da vida religiosa, da espiritualidade e da piedade dos
fiéis. Nela se enraizaram instituições de solidariedade social como
aquela, tão portuguesa, das Misericórdias.
Hoje ninguém sabe o que
pode acontecer nos próximos anos. Trazem, sem dúvida, violência e
sofrimento. Mas um dos pilares do Cristianismo é a virtude da esperança.
Um dos pilares de qualquer sociedade, cristã ou não cristã, é a
resistência à morte. Como homens temos de lutar pela vida. Como cristãos
temos de cultivar e esperança, sem perder a lucidez nem a
responsabilidade. Jesus Cristo não veio para nos propor a resignação,
mas para nos ensinar a lutar. O que Jesus promete aos seus discípulos e a
nós mesmos não é uma vitória fácil, mas a salvação. É Ele quem nos
convida a descobrir na História a manifestação da transcendência divina.
Nada nos pode separar do amor de Cristo. Permitam-me, pois, que repita
aqui as palavras do Papa João Paulo II no primeiro discurso do seu
pontificado: «Não tenhais medo!». Talvez tenhamos de viver dias
difíceis. Ou mesmo muito difíceis. Mas quem se identifica com Jesus
Cristo não pode ter medo de nada.»
(excerto de «O Tempo de Santa Beatriz da Silva», in Santa Beatriz da Silva - Uma estrela para novos rumos, Princípia, 2013)
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