19.7.03

POETAS ESCANDINAVOS (I)

LASSE SÖDERBERG
Nasceu em 1931 em Estocolmo, Suécia.
A sua poesia está marcada pelo seu carácter viajante. Traduziu para sueco diversos autores de língua espanhola.

PÔR-DO-SOL
(Granada)


Erva,
voz queimada.

Poço,
cravo partido.

Céu,
fato branco manchado de sangue.

DOIS HOMENS
(Francis Bacon)


A carne é sempre mártir, lacerada.
Nos ritos nupciais via a chacina,
tanto prazer em glória tão mesquinha.
Uma só causa: a carne deformada.

Baixo ventre mental indecifrado,
milagre inferior que mais alteia
domínio do sexo feito ideia.
Eis o exemplo por Bacon encontrado:

dois homens nus num leito descomposto,
um dos dois é o pobre, o outro o rico,
o sedutor seduz o seduzido,

não importa qual deles toma o gosto
ao poder do seu cravo já imposto
sobre a carne do outro: esse que ri.

(de Coração de Papel, tradução colectiva, revista por Ana Luísa Amaral e Gonçalo Vilas-Boas - Quetzal editores, 2001 - Poetas em Mateus)

SOBRE A ARTE DE MANEJAR UM CADÁVER

"Su cadáver estaba lleno de mundo"
César Vallejo


Começaram por levar o cadáver
de helicóptero desde um descampado,
e para que todos o vissem depositaram-no
seminu em cima de um lavadouro.

Fotografaram os restos mortais.
Enterraram-nos depois em qualquer parte
para que não se movessem
e mais ninguém os pudesse ver.

Porém na sua ausência o medo cresceu
como o cabelo e as unhas dos mortos.
Desenterraram o cadáver e cortaram
um polegar como prova da sua morte.

Incineraram depois o corpo
e enterraram algures as cinzas
para que não pudessem sublevar-se
e formar um exército invisível.

Passará muito tempo e o medo
continuará a enterrar e desenterrar
o cadáver que comanda uma guerra de morte
em Santa Cruz e noutras partes do mundo.

(Tradução de Casimiro de Brito, in 21 Poetas Suecos, coordenação de Ana Hatherly e Vasco Graça Moura, Vega, 1981?)

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